quarta-feira, 25 de junho de 2008

A HOMOSSEXUALIDADE E NÓS

A questão da diferença está mais do que impressa na sexualidade humana. Anatomicamente somos distintos como machos e fêmeas e mesmo dentro dessas categorias existem diferenças individuais. As anatômicas nos causam desconforto, seja por que implicam beleza, masculinidade, feminilidade ou mesmo fantasias sexuais (tamanho de mamas, de pênis, musculatura, gordura corporal, etc.). Tendemos a ver, como nossos antepassados que “perfeição” física e beleza é um dom que veio de Deus e que se traduz em bondade, confiança e bom caráter. Nada mais irreal. O mesmo se dá com a orientação sexual de cada um de nós. Pode parecer incrível, mas não optamos, escolhemos se vamos ter desejo ou tesão por homem, mulher ou ambos. Não é uma questão de consciência ou de moral; é uma questão de desejo e esse não depende da vontade e sim de algo ainda indefinível. Por isso a Medicina e a Psicologia aboliram o termo opção quando se fala de homossexualidade. Não é, na verdade, uma opção e sim uma falta de opção, como muitos homossexuais falam.
Também a homossexualidade não implica em marcas de caráter de maneira geral. Significa apenas ter desejo por alguém do mesmo sexo e não bondade, honestidade, chatice, agressividade, etc. Existem homossexuais bons, maus, honestos, desonestos, chatos, legais, como qualquer outra pessoa, seja ela heterossexual, bissexual, transexual, ou sei lá mais o quê. Quem a pessoa é ou se torna tem relação com as heranças genéticas, a educação, as vivências pessoais e afetivas. A homossexualidade parece ter forte herança genética, mas não só. Ainda não podemos afirmar causa ou causas, mas o importante é saber que não é doença e muito menos sem-vergonhice. Se formos pesquisar de verdade, à nossa volta existem muito mais homossexuais do que sabemos e isso não muda nada em nossas vidas. São pessoas como outras quaisquer, vivendo, amando, se frustrando e fazendo o melhor para si e para o mundo. Não vale à pena romantizar a homossexualidade também. Não são melhores nem piores. Possivelmente sofrem mais por conta da diferença e muitas vezes da exclusão que sofrem socialmente ou que se impõem.
Já é tão difícil viver de maneira íntegra, responsável e gentil com os outros, por que buscar na diferença a exclusão de pessoas que não conhecemos ou que se conhecemos, a orientação sexual (esse é o termo técnico), é apenas mais uma característica dela e talvez, na maioria dos casos, a menos importante?
Quem se preocupa menos com sexualidade alheia tem mais chances de se ocupar de sua própria sexualidade e aí sim se realizar nela!

segunda-feira, 9 de junho de 2008

A SEXUALIDADE E NÓS

por Alexandre Saadeh*

Dia destes uma paciente me perguntou em alto e bom som por que o sexo, que deveria ser uma coisa tranqüila, não é?

Por vários motivos. Penso que o mais importante deles é o fato de apesar de ser uma atividade fisiológica e de base biológica, ele é regido por valores culturais, religiosos e morais que o tornam um fenômeno único e de vital importância em nosso dia-a-dia desde que nascemos, pois é a forma que adquire o nosso prazer. A Psicanálise mesmo nos diz que qualquer prazer, em nosso desenvolvimento, ganha um cunho sexual.
A Medicina faz um esforço enorme para nos mostrar que a sexualidade tem um caminho “normal”. Isso cria o mito de que existiria um sexo, ou expressão sexual, considerada normal, adequada. Aliás, essa é uma pergunta que não canso de ouvir, se o paciente é normal por fazer isso, aquilo, dessa forma ou daquela. A Organização Mundial de Saúde nos diz que é normal a sexualidade exercida em plenitude entre dois adultos humanos vivos. Agora o que eles fazem entre si só é da conta deles e, portanto, normal para eles. Excitar-se com pés, gostar de sexo oral, preferir mulheres ou homens gordos, tudo isso só poderia ser considerado “anormal” se impedisse a vivência de plenitude do indivíduo ou o fizesse sofrer. O grande problema é que nossa moral, cultura e religiões penalizam, culpabilizam e condenam muitas formas de expressão da sexualidade por pura tradição, ignorância e preconceito. Muitas dessas expressões sexuais, como por exemplo, a homossexualidade, fantasias específicas, gostos particulares, não dependem de uma decisão racional, não são opções de alguém. Aliás, são falta de opção, pois há um determinismo biológico/psíquico em tudo isso.
Muitos estudos recentes demonstram que nosso cérebro, desde a infância, registra e busca replicar as experiências prazerosas, qualquer que seja. Os centros do prazer e da gratificação são próximos e a vivência sexual é capaz de produzir uma marca que voltará a ser buscada quando de uma nova experiência sexual.
Com isso tudo, cabe a pergunta, o que é normal em relação ao sexo? O quer a sociedade determina, o que dá prazer ao indivíduo ou o que excita a díade? Talvez tudo, possivelmente uma dessas opções. O que não podemos é julgar alguém por seu comportamento sexual. Ele só é uma parte do indivíduo, talvez a menos importante na convivência comunitária. Algo que é muito particular e específico. Delicado! Pois se assim não fosse, nossa vida sexual seria um livro aberto, o que não acontece. Quando você ouve alguém fazendo “propaganda” de sua vida sexual, desconfie, a grande maioria é enganosa. Sexo serve para nos dar prazer e aprender a conviver com as diferenças presentes em outros seres humanos. Nós transformamos isso num critério de valor, qualitativo, que diz se alguém é melhor ou pior. Acho importante ter em mente que a sexualidade madura é fruto de nossa evolução embriológica, nossas experiências vitais com prazer que são únicas e a construção pessoal de valores. Ou seja, é complexa, fácil de se complicar e nos tornar culpado. E isso acaba pesando em nosso cotidiano, fazendo do sexo não mais um “lugar” de relaxamento, exposição e aceitação do outro e de nós mesmos, mas sim um “lugar” onde julgamos e somos julgados; selecionamos e somos selecionados. Para quê?

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* Psiquiatra, Professor e Doutor em Sexologia